Tons de laranja. Tons de azul. Explosões de cores e
brilhos. Uma bailarina girava em ponta. Um palhaço acenava esguichando água da
flor de seu paletó. Do escuro, todas aquelas luzes clamavam por atenção. Como
uma onda de energia boa e entusiasmada, olhinhos faiscantes de alegria
devolviam as luzes dos palcos. Suspiros de surpresa ecoaram quando o boi-bumbá
resolveu abandonar os tablados e circundar a plateia. De todos os miúdos
sentados, atentos, a mais emocionada era Laura. Laurinha era uma menina de lindos
cachinhos loiros, olhos verdes, tímida. Esta era sua primeira vez assistindo a
um espetáculo teatral. O sol estava vermelho, redondo. Lembrava a bandeira do
Japão, ou ainda, o tapete da sala de sua avó. E Laura despertava, lá de cima do
telhado, de sua lembrança de segurança. Acontecera no auditório da escolinha do
fundamental, e desde então se tornou um dos mantras de meditação, de equilíbrio
nos momentos difíceis. Que não foram poucos... A fase escolar passou como quem
vem pra bater e abandonar. E timidez não ajuda. Todas as vezes que tinha que se
refazer, esta era sua melhor recordação de alegria. Fez aulas de teatro, canto,
balé, dança e percussão. No mundo dos artistas descobriu a vida e descobriu-se
viva. Dizem que os tímidos vivem por dentro, e é no palco que explodem toda
essa vivência contida. Para Laura, que encontrara no teatro os batimentos e os
suspiros que lhe mantinham vívida, essa detonação era tão forte, tão devastadora,
que ali fez-se uma carreira. Trilha que lhe levou a Thiago. Este, assim como a
outra, era introvertido demais para enfrentar os percalços sociais. Mas de modo
diferente, achou tranquilidade atrás das lentas das câmeras. E como todos que
vivem pelo coração, fazia imprimir e sentir nas fotos os anseios de suas
percepções. Fotografara Laura num espetáculo de dança contemporânea. Os
movimentos leves, os olhares complacentes à plateia, a elegância, e a altivez
de quem se entrega com corpo e alma chamaram-lhe a atenção. Dentre as quinze
bailarinas que compunham a coreografia, apenas Laura sobressaía-lhe às lentes.
As fotos mais fortes e lindas de sua obra. As calopsitas já a chamavam,
amanhecera. O cheiro de café, e o barulho dos ovos tintilando na frigideira a
convidavam para descer. Provavelmente todos da casa haviam acordado. Bom dia.
(Deyvid Peres)
Nenhum comentário:
Postar um comentário