Vinte e Três de Abril



Hoje é dia de feijoada de Ogum aqui em casa. Acho isto tudo muito interessante. Minha mãe forra a mesa do almoço com uma tolha branca rendada. No altar, o santo tem sua vela acesa, e flores, muitas flores. A casa agora tem um perfume adocicado, seja pelas flores, seja pela couve que está sendo refogada. A panela de feijão é enorme, mal cabe em cima do fogão de quatro bocas. Uma vasilha de farofa já está sobre a mesa. Alho. Sinto cheiro de alho, talvez do arroz ao fogo. Minha mãe é bem brasileira, e daquelas bem enraizadas em sua cultura. Sempre foi pobre, filha de nordestina e mineiro, cresceu envolta às várias matrizes espiritualistas. Extremamente supersticiosa, grande conhecedora das ervas. Acreditem, já tomei todos os chás possíveis, todos os banhos com ervas que ela conhece e, às vezes, rola uma defumação. Pegam-se ervas de diferentes propósitos, trituradas, e assim, jogadas à brasa acesa. A fumaça é densa, branca, e muito, muito cheirosa. É um dia de reunião familiar, mas este ano, apesar de não ser o recomendado, ainda vêm os meus irmãos com esposas e filhos para a ceia. Menos mal, normalmente, é a família toda, com direito aos cachorros a tiracolo. O ruim deste dia são os fogos. A Luna, cadela que tenho há 10 anos, está ficando velhinha e cada vez mais assustada. Ela cisma que quer se proteger do barulho dentro de casa, o que a faz ganhar uns gritos de reprovação da minha mãe. Não soltem fogos de artifício. 


(Deyvid Peres)

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